Venha compartilhar um pouco do trabalho que realizo como historiador e professor da cidade de Cotia. Mergulhe no passado das pessoas que construiram este lugar, recorde fatos marcantes que deram identidade cultural a esta cidade.

quinta-feira, 28 de abril de 2011

A DOR DA MORTE


“A morte é um grande despertar.” (Nelson Rodrigues)

Um mês depois.

O meu pai desencarnou no dia 26 de março, de manhã, três dias antes de completar 78 anos. Acostumado a me solidarizar com a partida de amigos e de pessoas próximas, pela primeira vez senti a dor da morte de alguém com quem que convivi durante cinquenta e um anos. A sensação é que a gente perdeu um pedaço e um grande vazio toma conta de tudo. Na verdade, é uma sensação indescritível e que não podemos desejar a ninguém, mesmo quando estivermos tomados por sentimentos de ódio e vingança. 

Quando minha mãe ligou aflita dizendo que o meu pai não estava bem e que precisava de ajuda, senti um frio repentino e fui ao socorro. Chegando lá, meu filho, desesperado, dizia para corrermos até o hospital e posicionou o carro na garagem. O Ícaro, com lágrimas nos olhos e já pressentindo o pior, pegou meu pai no colo e o levou até o carro. Em poucos minutos estávamos na porta do Hospital de Cotia e minutos depois da nossa chegada recebemos a notícia de que ele tinha partido. Na minha cabeça passou como num filme todo o nosso tempo de convivência, os sentimentos que vivemos. De tudo isso ficou o conhecimento de vida que ele me deixou, e isto é muito forte.  Ah! Como eu lamento, poderia ter curtido muito mais o meu pai. 

Outro sentimento que não imaginava que fosse tão precioso e importante em um momento como este, é o de ouvir a voz de alguém que se solidariza. Dá um alívio para a alma. Mesmo que este calor humano venha através de um abraço, de um olhar ou de um gesto de silêncio.

José Martinez Molero chegou ao Brasil vindo da Espanha, no começo do século  XX,  na barriga de sua mãe, deixando para trás uma parte da família, em Madri. Segundo Martinez, sua mulher Dolores Molero Sales e os treze filhos se fixaram em Tanabi, depois em Votuporanga, no interior de São Paulo, e ainda depois no resto do Brasil. Neste ano se completa o centenário da chegada da família no Porto de Santos. Gente que trouxe na mala da vida a cultura de mais de mil anos e que foi paulatinamente se misturando com a daqui, também antiga, e construiu esta nossa, tão diferente. Grão de bico (garbanzo e puchero) com mistura de ingredientes daqui e a música caipira do interior com sotaque castelhano, o trato com a terra e a plantação de café, e tantas outras coisas que fazem este país original, mas também acolhedor. Ah! Como eu lamento, deveria ter aprendido muito com ele!     
    
Meu pai foi gente simples: bem cedo mostrou habilidade para o comércio e iniciou negociando cabeças de gado e praticando outros escambos. O que muito marcou minhas lembranças neste tempo de convívio foi no final da década de 60, época em que ele vendia queijos trazidos de Minas Gerais. Quando ele chegava de viagem sempre me trazia um mini queijo e dizia que uma menina apaixonada tinha mandado. Durante muito tempo alimentei a idéia de que tinha uma namorada distante, que nunca conheci. Foi meu primeiro amor platônico. Uma outra profissão: meu pai também foi marceneiro, artista e criativo, e muitos modelos de sofá em que a gente se senta hoje foi criação dele. Na sua profissão criou miniaturas de móveis de casa. Era um profissional extraordinário, mas não gostava da profissão. Vendeu alumínio e foi galinheiro. É... galinheiro! Ele tinha um caminhão Ford e saía pela região de Votuporanga, indo até os sitiantes para comprar frangos e galinhas, e uma vez por semana trazia pra São Paulo. Foi assim que conheceu a grande metrópole, em 1968. Cozinheiro de mão cheia, sua última profissão foi a de pasteleiro. 

Agora posso revelar um segredo sobre uma parte da sua vida. Quando foi convocado pelo exército se apaixonou pela minha mãe, não aguentou a distância e desertou. Durante vinte anos ficou sem tirar documentos, mas casou-se com ela e viveram 55 anos juntos. 

Meu pai. Um homem simples, com boas qualidades e defeitos como todo mundo, mas desde o dia da sua partida ficaram só as coisas boas na minha memória. Pessoa alegre e sempre disposta a um bom sorriso. Esta é só uma pequena parte da sua história e sei que onde ele estiver, deve estar avaliando e reavaliando sua passagem por aqui. Muita saudade.

Professor Marcos Roberto Bueno Martinez.   

terça-feira, 19 de abril de 2011

AS IRMANDADES DA FREGUESIA DE COTIA


APRESENTAÇÃO

O texto “As Irmandades da Freguesia de Cotia”, escrito pelo Padre Daniel Balzan, nas suas  entrelinhas vai revelando o cotidiano religioso da freguesia. A hierarquia da sociedade colonial é presente nas relações estabelecidas nas irmandades: cada um no seu lugar. Conflitos e devoção marcam este texto e a presença onipresente da Igreja se confunde com o Estado. É bom lembrar aos leitores que a visão apresentada deste momento da História de Cotia utiliza documentos oficiais da Igreja, sendo portanto, uma leitura mais rica em alguns detalhes, que possibilita o questionamento sobre o cotidiano dos negros da região. Uma boa leitura.  

Professor Marcos Roberto Bueno Martinez.


AS IRMANDADES DA FREGUESIA DE COTIA


As irmandades que existiam, antigamente, na freguesia de Nossa Senhora de Monte Serrat de Cotia eram três: a)  do Santíssimo Sacramento, b) de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos e c) de Nossa Senhora da Conceição. Umas dessas associações congregavam apenas homens. Outras reuniam, preferencialmente, negros. Outras, ainda, preferiam pessoas brancas!

A irmandade do Santíssimo Sacramento foi instituída pelo Pe. Antônio de Toledo Lara enquanto servia como vigário de  1751 a 1759. Em 1757 visitou a freguesia de Nossa Senhora de Monte Serrat de Cotia, o Pe. Antônio de Medeiros (vigário de Nossa  Senhora da Candelária de Itu e visitador ordinário  das vilas e freguesias do bispado de Dom Frei Antônio de Madre de Deus, 2º bispo de São Paulo). O visitador não poupou elogios ao vigário por ter tomado a iniciativa de instituir mais uma irmandade na freguesia:

Não menos se-lhe louva o zelo que tem mostrado na instituição da Irmandade do Ssmo. Sacramento, do qual todos devemos ser mais devotos, por dele nos proceder todo o bem, pois, sem dúvida era coisa muito feia e digna de se estranhar não haver a Irmandade de tão Altíssimo Senhor em uma freguesia de tão aumentado e lúcido povo como este”  (Tombo de Cotia: 1728-1844, p.29v).

A tarefa da Irmandade do Santíssimo Sacramento era promover o culto à Eucaristia. Esta prática só era possível nos centros urbanos, ou seja, na Igreja Matriz da freguesia, pois exigia a presença do padre. Os irmãos eram obrigados a assistir à missa todas as quintas feiras,  havendo em seguida a adoração do Santíssimo Sacramento e  bênção solene. Os membros vestiam roupas vermelhas durante o culto, carregavam tochas nas procissões eucarísticas dentro e fora da igreja, como também acompanhavam o padre quando levava o viático aos gravemente enfermos. Apenas os homens podiam ser membros desta irmandade e, segundo as Constituições de Bahia (1707), os cantores (homens) e os irmãos podiam ficar no presbitério que era separado do resto da igreja por uma pequena grade. Portanto, quem participava desta Irmandade se sentia privilegiado e altamente honrado. (cf. HOORNAERT, Eduardo et alii. História da Igreja no Brasil. Tomo 2, Vozes, Petrópolis, RJ. 1977, p.237).

Por esse tempo, já existiam na freguesia de Cotia as Irmandades de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos e de Nossa Senhora da Conceição. A finalidade da Irmandade do Rosário era difundir a devoção a Nossa Senhora através do rosário. Além do terço, os irmãos cuidavam do enfeite do altar da santa e participavam de procissões, particularmente daquela da festa de Nossa Senhora do Rosário no mês de outubro. Os membros desta irmandade podiam ser tanto homens quanto mulheres, geralmente, negros. A irmandade de Nossa Senhora da Conceição congregava homens e mulheres, preferencialmente brancos. Sua finalidade era difundir a devoção a Nossa Senhora através da consagração da pessoa, da família e da paróquia à Virgem Maria.

Cada irmandade tinha o altar da santa protetora, sepulturas próprias para o enterro dos irmãos associados e seu patrimônio. Cada uma assegurava aos sócios um enterro decente. Estes, porém, eram obrigados a pagar, periodicamente, uma contribuição em dinheiro, que era estabelecida pela própria irmandade ou pelas autoridades eclesiásticas.

Parece que, com o decorrer dos anos, a Irmandade de Nossa Senhora da Conceição foi se dividindo em duas confrarias: na dos “homens brancos” e na “dos homens pardos”. Não sabemos qual foi o motivo dessa divisão. Talvez os “pardos” queriam distanciar-se dos brancos e vice-versa, a molde da sociedade da época. Na prática era impossível uma irmandade de brancos e negros!

Quando, em abril de 1776, chegou na freguesia de Cotia o bispo Dom Frei Manoel da Ressurreição, a Irmandade de Nossa Senhora da Conceição dos homens pardos estava em decadência. O visitador insistiu junto ao vigário Pe. Manoel da Cruz Lima e aos irmãos da Irmandade a elegerem uma diretoria atuante e dinâmica, capaz de reanimar a devoção a Nossa Senhora.

“Com grande mágoa nossa achamos muito decadente a confraria de N. Senhora da Conceição dos homens pardos, cuja diminuta receita por se não pagarem os anuais não chega para a necessária despesa e por isso se deixam de cumprir os encargos do compromisso. Estranhamos a sua pouca devoção e recomendamos ao Rev. Pároco que incessantemente afervore a sua tibieza e faça muito para que nas suas devoções, a que se deve presidir, se elejam para a mesa, irmãos devotos, zelosos e amantes da Soberana Rainha dos Anjos e Mãe dos pecadores” (Tombo de Cotia: 1728-1844, p.55).

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Pelos anos de 1907 surge, em Cotia, um problema grave envolvendo a Irmandade de São Benedito. O vigário era Pe. Emílio Vigorita. Este foi espancado por alguns membros daquela irmandade por não permitir que os associados saíssem pelas ruas pedindo esmolas com o oratório do santo. Como consequência  a capela de São Benedito ficou interditada durante dois anos. Vejamos como Pe. Aurélio Fraissat descreve o caso:

“A capela de São Benedito estava fechada em virtude de um interdito lançado por S. Excia. Rev. Sr. Dom Duarte Leopoldo e Silva para expiação de um crime que cometeram algumas pessoas que faziam parte da Irmandade de S. Benedito – espancaram o Vigário por ter este querido impedir que tirassem esmolas pelas ruas com o oratório ou relicário de S. Benedito e ter feito isto com uma certa violência demasiada. Tendo isto chegado ao conhecimento do Sr. Bispo, ele mandou que se fechasse a Capela com um interdito. Este interdito foi levantado no dia 16 de maio de 1909. Era um Domingo, depois da missa paroquial, o Pe. Bosse rezou com o povo, de joelhos, os salmos penitenciais e em seguida fez sair a procissão com a imagem de S. Benedito para a capela deste Santo; tendo chegado, fizemos a abertura da porta e entoamos o “Te Deus”, ficando assim de novo aberta a Capela de S. Benedito” (Tombo de Cotia: 1878-1912,  p.31. Arquivo Metropolitano Dom Duarte Leopoldo e Silva).

Padre Daniel Balzan

terça-feira, 12 de abril de 2011

IMIGRAÇÃO JAPONESA



Um desfile inesquecível em Cotia foi o da comemoração do centenário da imigração japonesa no Brasil, em 2006, data em que Cotia completava 150 anos. Junto com o Departamento Pedagógico começamos a  pensar o desfile do aniversário com o tema imigração cinco meses antes da data. As escolas que decidiram participar tinham a incumbência de transformar o tema em conteúdo e arte para o desfile. As fotos que mostramos abaixo são o resultado de um trabalho de equipe. O que podemos apreciar é uma cidade com gente de todos os lugares e etnias diferentes convivendo em harmonia.  











 
















Professor Marcos Roberto Bueno Martinez.