Venha compartilhar um pouco do trabalho que realizo como historiador e professor da cidade de Cotia. Mergulhe no passado das pessoas que construiram este lugar, recorde fatos marcantes que deram identidade cultural a esta cidade.

quarta-feira, 9 de outubro de 2013

"ARTERICES" DE CRIANÇAS


Todo mundo deve inventar alguma coisa, a criatividade reúne em si várias funções psicológicas importantes para a reestruturação da psique. O que cura, fundamentalmente, é o estímulo à criatividade. Ela é indestrutível. A criatividade está em toda parte (Niseda Silveira).

 Dizem que quando a criança tem uma infância recheada de brincadeiras que estimulam a imaginação e a criatividade serão adultos independentes e felizes. Talvez seja verdade. Só que criança de cidade grande é bem diferente da do interior, pelo menos no meu tempo, lá em Votuporanga. Colecionávamos gibis de super-heróis,e lá no interior eles sempre chegavam com quase trinta dias de atraso. Quando alguns de nos íamos passear na Capital e antecipávamos a chegada dos gibis, era a maior festa. Tínhamos algumas vantagens em relação às crianças da cidade grande. Colecionar bicho-de-pé, arte exclusiva do interior. Juntávamos a molecada,entrávamos no chiqueiro de alguém até pegar o tal bicho (na década de setenta era muito definido o que era brincadeira de menino e menina). Depois vinha um tempo de maturação, aquela coceira louca e frenética. Formava tipo um olho-de-peixe e assim era chamado. Essas brincadeiras simples, aos olhos de muitos, iam formando uma amizade, estabelecendo laços de confiança e companheirismo, algumas até hoje.

Também acho que criança de cidade tem suas brincadeiras. Depois da escola juntávamos a turma para jogar bola e procurar um tanquinho para dar um mergulho. Toda vez que íamos nadar escondido, nos rios ou córregos da cidade (às vezes andávamos quilômetros para encontrar um tanquinho do jeito que queríamos de baixa de muito Sol).quando chegávamos em casa sempre levávamos um castigo. Achava que alguém da turma tinha me entregado ao meu pai por ter ido escondido dele que ia nadar. Depois de adulto descobri que me pai usava uma técnica muito simples: com a mistura do sol com a água a pele ficava morena, ele passava a unha sem eu perceber e fazia um risco. O denunciante era eu mesmo. Ninguém naquela turma entregava os segredos e as “arterices” um do outro. Amizade era coisa séria. Bola queimada (nessa brincadeira as meninas participavam), corre-corre, salvo-pega, esconde-esconde, bolinha de gude, brincadeira do passa anel (era nas brincadeiras do anel que se abria espaço para os primeiros flertes) e tantas outras brincadeiras faziam parte da nossa agenda diária. Elas iam estimulando nossa criatividade e fantasias.

Hoje algumas coisas são diferentes (não que hoje seja melhor ou piorque antes, o contexto é outro). Na minha cidade do interior, tinha o guarda-noturno que, depois das dez, passava apitando e pedindo para as crianças irem para casa (íamos prontamente).Uma figura que ficávamos com medo era do juiz de menores, os adultos diziam que se ficássemos depois das dez na rua nos levaria pra delegacia. Brincávamos de olho nos carros que víamos depois desse horário, passando tanto tempo, não sei dizer se realmente existia esse personagem. Um dia, estávamos brincando de salvo-pega e alguém gritou: olha o juizado. Foi uma correria cada um para um lado. Um amigo ficou enroscado no arame farpado, levou oito pontos na coxa da perna. Ficamos uns bons dias sem aparecer na esquina da rua. Será que existia mesmo esse juizado de menores que amedrontava nossa época de criancice?


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