Venha compartilhar um pouco do trabalho que realizo como historiador e professor da cidade de Cotia. Mergulhe no passado das pessoas que construiram este lugar, recorde fatos marcantes que deram identidade cultural a esta cidade.

terça-feira, 9 de junho de 2015

“CAMINHANDO CONTRA O VENTO SEM LENÇO E SEM DOCUMENTO...”


Na década de setenta, caminhar sem documento era cana na certa ou humilhação. Esculhambação! O documento que valia nessa época era a carteira de trabalho com registro de emprego. Se não houvesse registro de um trabalho, o esculacho era quase certo. De vagabundo pra baixo. Em uma parada policial, a Carteira Profissional indicava que você era um cidadão. A carteira de trabalho era sua alforria. 

Cidadão completo era aquele que apresentava a carteira com registro de trabalho, orgulhosamente! Com o tempo, esse documento majestoso foi saindo de cena. O Milagre Econômico do Regime Militar não surtiu o efeito pretendido e o desemprego apareceu, violentamente, junto com a inflação.Em um país que o desemprego é grande, a carteira perdeu seu valor no sentido de estabelecer cidadãos. Ora, cidadão é um conceito que vai além de um registro na carteira profissional.  

Depois desse período...

A carteira perdeu seu status quo! Entra em cena a carteira de identidade... Lembram?

Depois desse período sombrio, na década de oitenta, a carteira de identidade aparece soberana. Um tempo de Diretas Já! Um período de reconstrução da democracia. Uma explosão de eventos culturais. Quase todo mundo querendo dizer alguma coisa. A carteira de Identidade aparece leve e suave. Sua exigência não era tão necessária como a profissional. Para abrir um crediário, a carteira de trabalho tinha sua importância, mas não sozinha - agora acompanhada da identidade. Começava a aparecer um cidadão light, mas indignado com a injustiça.

Com o tempo, a carteira foi substituída, no caso de uma compra de crediário, pelo holerite.
Inflação, desemprego e outras mazelas sociais, mas a identidade, quando solicitada, o cidadão não se apresentava tão submisso. Questionava! Falava de direitos. Os tempos eram outros. A Constituinte promulgada. Cidadão.

Depois da década de oitenta...

A democracia consolidada e o mercado ampliado e,consequentemente,o consumo. Milhões de brasileiros saindo da miséria foram inseridos no mundo do consumo, alucinados. A carteira profissional e a carteira de identidade estão quase aposentadas- o que vale como documento hoje é o CPF. Esses números dizem que você, como cidadão, está inserido no mercado de consumo. Cidadão consumido.

Agora, a luta é contra a corrupção. A ditadura militar ficou lá pra atrás (apesar de que há gente com saudade). O que vale é o que temos não o que somos. Não precisamos de documentos para dizer que queremos ser cidadãos. Já somos! A caixa do mercado pergunta antes de registrar a compra:o senhor quer Nota fiscal Paulista? Sim ou não? Sim! Qual o número do seu CPF?Agora, sim, cidadão inserido. É bom lembrar que ainda temos milhões que ainda não têm e não tiveram nenhum desses documentos. Não foram inseridos no mercado de consumo. Estão à margem!


Qual será o próximo documento que entrará em moda? 

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